É óbvio que o risco de cometer uma grande injustiça era grande diante do grande volume de publicações que ganharam o mundo sob a forma escrita em plena era da reprodutibilidade técnica — que possibilitou a disseminação em massa de livros, filmes e obras de arte. Mas em nome da boa literatura e do incentivo à leitura de qualidade, 84 críticos convocados pelo jornal espanhol El País se debruçaram sobre a tarefa de escolher os 100 melhores livos das duas primeiras décadas do século XXI.
Embora louvável, a lista, apesar de traçar um vasto panorama da literatura contemporânea, peca por alguns deslizes flagrantes. Um dos maiores é a falta de um autor brasileiro no rol das grandes obras apontadas pelos especialistas. Nem mesmo a literatura portuguesa foi contemplada na relação, que entre as obras de grande destaque do século aponta até o clássico infanto-juvenil Harry Potter. Mesmo assim, a lista serve de marco e de referência da produção literária recente e traz autores de obras de grande vulto e obras que se debruçam sobre questões emergentes que merecem ficar na fila de leitura dos amantes da boa escrita.
Confira os 21 destaques da lista e suas respectivas sinopses e a relação completa dos melhores livros do século XXI segundo os críticos consultados pelo El País:
1 – ‘2666’, Roberto Bolaño
Fiel aos dois principais temas que atravessam toda a obra do autor chileno – violência e literatura -, o livro é composto de cinco romances, interligados por dois dramas centrais: a busca por um autor recluso e uma série de assassinatos na fronteira México-Estados Unidos.
2 – Austerlitz — W. G. Sebald
Obra-prima de W. G. Sebald e um dos grandes romances deste século, Austerlitz é a crônica de um homem em busca de sua biografia. Vagando pela Europa ao sabor do horário dos trens e da erudição acadêmica, o professor Jacques Austerlitz mal suspeita que está a ponto de encontrar seus próprios passos perdidos em outro país e em outra época.
3 – A Beleza do Marido — Anne Carson
Ensaio em 29 tangos, como definiu a autora, partindo da noção de Keats sobre a verdade e o poder da beleza. Publicado originalmente em 2001 e repleto de referências à Antiguidade Clássica, este é também um relato poético sobre um antigo amor que dá lugar a um casamento falido: um tango que pode ser dançado até ao fim.
4 – A Festa do Bode — Mario Vargas Llosa
Com uma pesquisa histórica rigorosa e uma preocupação flaubertiana pelos detalhes, ele recria uma República Dominicana de meados do século XX para recontar a história do general Rafael Leonidas Trujillo Molina – o “Bode” – e a implacável ditadura que implantou no país durante seus 31 anos de governo. Ao entrelaçar três histórias – a volta de Urania a Santo Domingo, após 35 anos, para visitar o pai doente; o círculo mais próximo a Trujillo, com suas intrigas e execuções; e um grupo de insurgentes que prepara um atentado ao ditador -, Vargas Llosa relata o fim de uma era e discute a natureza insaciável dos regimes totalitários.
5 – Reparação — Ian McEwan
Na tarde mais quente do verão de 1935, na Inglaterra, a adolescente Briony Tallis vê uma cena que vai atormentar a sua imaginação: sua irmã mais velha, sob o olhar de um amigo de infância, tira a roupa e mergulha, apenas de calcinha e sutiã, na fonte do quintal da casa de campo. A partir desse episódio e de uma sucessão de equívocos, a menina, que nutre a ambição de ser escritora, constrói uma história fantasiosa sobre uma cena que presencia. Comete um crime com efeitos devastadores na vida de toda a família e passa o resto de sua existência tentando desfazer o mal que causou.
6 – Limonov — Emmanuel Carrère
Limonov, conta na forma de um romance eletrizante, uma história real: a vida de uma figura polêmica cuja trajetória – de poeta russo a revolucionário, de celebridade a presidiário – acompanha a própria história da Europa no século XX. De forma inovadora, Emmanuel Carrère parte de fatos reais – a vida de Eduard Limonov, delinquente, escritor, mendigo, mordomo, político radical russo – para construir uma história de não ficção com as bases clássicas do romance, em que acompanhamos a vida e as peripécias de um personagem marcante, passando por uma série de quedas e apogeus.
7 – Seu Rosto Amanhã — Javier Marías
Contar ou calar? Esse dilema, já presente na primeira parte desta trilogia, retorna em Dança e sonho, cuja narrativa está centrada na violência e no medo, que nos agridem cotidianamente. Como observa o pai do narrador, Jaime Deza, ao contar a este os horrores da guerra civil que testemunhou, ouvir o relato talvez seja pior do que presenciar o fato: a imagem do que vimos é mais fácil de apagar, mas a memória “não nos possibilita muita alteração do ouvido, do relatado”.
8 – Borges — Adolfo Bioy Casares
Melhor amigo e parceiro literário de Jorge Luis Borges, um dos maiores autores argentinos, Casares narra em detalhes ricos e contundentes a vida do escritor. A obra é entremeada por trechos do diário de Casares, excertos dos trabalhos de Borges e fotografias.
9 – Verão — J. M. Coetzee
Verão é o terceiro livro da trilogia Cenas da vida na província, composta também por Infância e Juventude. Coetzee (Nobel de literatura de 2003) lança mão de artifícios narrativos refinados para compor um relato de ficção autobiográfica, construído de maneira múltipla e indireta. Quem estrutura a história é um pesquisador inglês, Vincent, interessado na vida de John Coetzee, autor que já morreu. Para escrever a biografia de Coetzee, Vincent recorre a outras fontes: os Cadernos do autor, com anotações autobiográficas, e entrevistas com pessoas que o conheceram.
10 – O Ano do Pensamento Mágico — Joan Didion
De uma das escritoras mais icônicas dos EUA, um retrato de um casamento e de uma vida, sem uma gota de autopiedade e escrito em um estilo envolvente e emocionante. Neste livro, Joan Didion narra o período de um ano que se seguiu à morte de seu marido, o também escritor John Gregory Dunne, e a doença de sua única filha. Feito com uma dose de sinceridade e paixão, O ano do pensamento mágico nos revela uma experiência pessoal e, ao mesmo tempo, universal. É um livro sobre a superação e sobre a nossa necessidade de atravessar – racionalmente ou não – momentos em que tudo o que conhecíamos e amávamos deixa de existir.
11- Minha Luta — Karl Ove Knausgård
Com A morte do pai, Knausgård inaugura um projeto monumental e ambicioso: a série Minha luta, composta por seis livros que logo se tornou best-seller na Noruega e fenômeno literário internacional. São seis volumes híbridos entre a ficção e a memória, em que o autor explora, com pleno domínio da atividade narrativa, as possibilidades da ficção contemporânea
12 – A Estrada — Cormac McCarthy
Num futuro não muito distante, o planeta encontra-se totalmente devastado. As cidades foram transformadas em ruínas e pó, as florestas se transformaram em cinzas, os céus ficaram turvos com a fuligem e os mares se tornaram estéreis. Os poucos sobreviventes vagam em bandos. Um homem e seu filho não possuem praticamente nada. Estão em farrapos e com os rostos cobertos por panos para se proteger da fuligem que preenche o ar e recobre a paisagem. Eles buscam a salvação e tentam fugir do frio, sem saber, no entanto, o que encontrarão no final da viagem. A estrada é uma comovente história sobre amadurecimento, esperança e sobre as profundas relações entre um pai e seu filho.
13 – Crematório — Rafael Chirbes
A morte de Matías Bartomeu, um ideólogo romântico que trocou a revolução pela agricultura biológica, é o epicentro do romance, em torno do qual surge um círculo de personagens surpreendente que, ao recordarem a sua relação com o morto, revelam também a sua vida. Através de Rubén, assistimos à reconstrução da história individual das várias personagens. Através da caracterização delas, o autor traça um quadro tão deslumbrante como terrível: a família como forma de exercício dos valores da propriedade, a especulação imobiliária, o dinheiro e os negócios sujos, o tráfico de capitais, a droga e o sexo, moedas de troca e tábua de salvação, a corrupção que mina toda uma sociedade.
14 – Dentes Brancos — Zadie Smith
O livro é um mosaico da Inglaterra multicultural da atualidade. O romance narra a história de dois amigos que se conheceram durante a Segunda Guerra Mundial, o inglês branco Archie Jones e o bengali Samad Iqbal. O final da guerra os separa, mas eles vão se encontrar em Londres 30 anos depois, onde moram com suas respectivas esposas e filhos. Em comum, os pais têm a dificuldade em lidar com os filhos, que adentram a idade adulta nos conturbados anos 90. Os pais não sabem o que fazer da nova geração. E a nova geração não sabe o que fazer com a própria vida.
15 – Manual da Faxineira: Contos Escolhidos — Lucia Berlin
Lucia Berlin teve uma vida repleta de eventos e reviravoltas. Aos 32 anos, já havia vivido em diversas cidades e países, passado por três casamentos e trabalhado como professora, telefonista, faxineira e enfermeira para sustentar os quatro filhos. Lutou contra o alcoolismo por anos antes de superar o vício e tornou-se uma aclamada professora universitária em seus últimos anos de vida.
Desse vasto repertório pessoal, Berlin tira inspiração para escrever os contos que a consagraram como uma mestre do gênero .
16 – Zurita — Raúl Zurita
Dividida em três partes que têm como pano de fundo o pôr do sol de 10 de setembro de 1973, a noite entre 10 e 11 e o amanhecer de 11 de setembro, dia do golpe militar no Chile, Zurita é o nome de um livro e um autor, como a figura de uma voz que é ocupada por infinidades de outras vozes nas quais um dos episódios mais feridos da vida de um país, uma história particular (quem escreve) e as imagens devastadoras convergem simultaneamente.
17 – Pós-Guerra: Uma História da Europa Desde 1945” — Tony Judt
Um dos historiadores e intelectuais mais respeitados da atualidade, dedicou pelo menos uma década de pesquisa e reflexão à desafiadora tarefa de escrever Pós-guerra, a primeira História da Europa contemporânea. Ao longo de 900 páginas, o autor vai de Portugal à Rússia, abrangendo 34 países e cobrindo um período de sessenta anos em uma só narrativa. Com uma abordagem inovadora, Judt trata praticamente todo o século XX como “o epílogo da Segunda Guerra” e considera o ano de 1989, marcado pelo colapso do comunismo e a queda do muro de Berlim, como o começo do fim do pós-guerra.
18 – Soldados de Salamina — Javier Cercas
Capturado por republicanos no fim do conflito, Rafael Sanches Mazas é levado com dezenas de homens ao pelotão de fuzilamento, mas milagrosamente escapa dos tiros e consegue esconder-se num bosque. Lá, é encontrado por um soldado inimigo que finge não vê-lo e salva sua vida. Décadas depois desse encontro intrigante, um jornalista, homônimo do autor, empenha-se em descobrir o que de fato aconteceu naquele momento e conta para isso com a ajuda de personagens reais, como o escritor chileno Roberto Bolaño.
19 – O Fim do Homem Soviético — Svetlana Aleksiévich
O povo russo assistiu com espanto à queda do Império Soviético. A política de abertura do governo Gorbatchóv impôs uma mudança drástica da estrutura social, do cotidiano e, sobretudo, da direção ideológica da população. Em O fim do homem soviético, Svetlana Aleksiévitch examina a vida das pessoas afetadas por essa transformação. Em cada personagem está um pouco da história russa – a mãe cuja filha morreu em um atentado; a antiga funcionária do Partido Comunista que coleciona carteiras abandonadas de ex-filiados; o velho militante que passou dez anos em um campo de trabalhos forçados.
20 – Persépolis — Marjane Satrapi
Marjane Satrapi tinha apenas dez anos quando se viu obrigada a usar o véu islâmico, numa sala de aula só de meninas. Nascida numa família moderna e politizada, em 1979 ela assistiu ao início da revolução que lançou o Irã nas trevas do regime xiita – apenas mais um capítulo nos muitos séculos de opressão do povo persa. Vinte e cinco anos depois, com os olhos da menina que foi e a consciência política à flor da pele da adulta em que se transformou, Marjane emocionou leitores de todo o mundo com essa autobiografia em quadrinhos, que só na França vendeu mais de 400 mil exemplares.
21 – A lebre com olhos de âmbar, Edmund De Waal
Edmund De Waal, um dos mais importantes ceramistas da atualidade, era fascinado pela coleção de 264 miniaturas japonesas entalhadas em madeira e marfim guardadas no apartamento do tio-avô, que vivia em Tóquio. Nenhuma daquelas peças era maior do que uma caixa de fósforos e, no entanto, seu valor revelou-se grandioso. Mais tarde, quando herdou as esculturas (chamadas de netsuquês), Edmund descobriu que, além da riqueza artística, eles carregavam uma história muito maior: revelavam o passado de sua família e eventos cruciais do século XX.
22 — O Grande — Juan José Saer
23 — Não me Abandones Jamais — Kazuo Ishiguro
24 — Anatomia de um Instante — Javier Cercas
25 — Felicidade Demais — Alice Munro
26 — Tábula Rasa — Steven Pinker
27 — Os Anos — Annie Ernaux
28 — Hurricane Season — Fernanda Melchor
29 — Sapiens: Uma Breve História da Humanidade — Yuval Noah Harari
30 — Kafka à Beira-Mar — Haruki Murakami
31 — El Nervio Óptico — María Gainza
32 — Anos de Formação: Os Diários de Emilio Renzi — Ricardo Piglia
33 — O Romance Luminoso — Mario Levrero
34 — Na Presença da Ausência, Mahmud Darwish
35 — Incêndios, Wajdi Mouawad
36 — Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar — Daniel Kahneman
37 — As Correções — Jonathan Franzen
38 — O Adversário — Emmanuel Carrère
39 — A Marca Humana — Philip Roth
40 — Canadá — Richard Ford
41 — Elizabeth Costello — J. M. Coetzee
42 — Terror e Utopia —, Karl Schlögel
43 — Lectura Fácil — Cristina Morales
44 — Las Poetas Visitan a Andrea del Sarto — Juana Bignozzi
45 — Ordesa — Manuel Vilas
46 — Distância de Resgate — Samanta Schweblin
47 — La Noche de los Tiempos, Antonio Muñoz Molina
48 — Teoria King Kong — Virginie Despentes
49 — The Blazing World — Siri Husvedt
50 — Os Testamentos, Margaret Atwood
51 — Americanah — Chimamanda Ngozi Adichie
52 — Diccionario de autores latino-americanos — César Aira
53 — Experience — Martin Amis
54 — Pátria — Fernando Aramburu
55 — A Worldly Country: New Poems — John Ashbery
56 — Fun Home — Alison Bechdel
57 — Gênio: Os 100 Autores Mais Criativos da História da Literatura — Harold Bloom
58 — Vida precária — Judith Butler
59 — El Día del Watusi — Francisco Casavella
60 — Reveries of the Wild Woman: Primal Scenes — Hélène Cixous
61 —. Homem Lento — J. M. Coetzee
62 — A contraluz — Rachel Cusk
63 — A Fantástica Vida Breve de Óscar Wao — Junot Díaz
64 — Jamais o Fogo Nunca — Diamela Eltit
65 — El Olvido que Seremos — Héctor Abad Faciolince
66 — Un Ángulo me Basta — Juan Antonio González Iglesias
67 — The Swerve — Stephen Greenblatt
68 — O Tecido do Cosmo — Brian Greene
69 — Homo Deus: Uma Breve História do Amanhã — Yuval Noah Harari
70 — Trabajos del Reino — Yuri Herrera
71 — Submissão — Michel Houellebecq
72 — A possibilidade de uma Ilha — Michel Houellebecq
73 — A Doutrina Do Choque — Naomi Klein
74 — La Casa de la Fuerza — Angélica Liddell
75 — Berta Isla — Javier Marías
76 — Asterios Polyp — David Mazzucchelli
77 — Necropolítica — Achille Mbembe
78 — C — Tom McCarthy
79 — Aqui — Richard McGuire
80 — Tudo o que Eu Tenho Trago Comigo — Herta Müller
81 — A Fugitiva — Alice Munro
82 — Suite francesa — Irène Némirovsky
83 — Faithless: Tales of Transgression — Joyce Carol Oates
84 — Stag’s Leap: Poems — Sharon Olds
85 — O Capital no Século XXI — Thomas Piketty
86 — Un apartamento en Urano — Paul B. Preciado
87 — Diccionario sánscrito-español. Mitología, filosofía y yoga — Òscar Pujol
88 — Retaguardia Roja — Fernando del Rey
89 — Complô contra a América — Philip Roth
90 — Harry Potter e o Enigma do Príncipe — J. K. Rowling
91 — A Última Noite — James Salter
92 — Clavícula, Marta Sanz
93 — O Artífice — Richard Sennett
94 — La estupidez — Rafael Spregelburd
95 — A poesia do pensamento — George Steiner
96 — O Preço da Desigualdade — Joseph Stiglitz
97 — Os Vagantes — Olga Tokarczuk
98 — Rien ne s’oppose à la nuit — Delphine de Vigan
99 — Consider the Lobster — David Foster Wallace
100 — Building Stories — Chris Ware